sábado, outubro 23, 2010

The Rope



The Rope - Prémio de Melhor Curta-Metragem no Festival de Cinema de Seattle em 2005.


A câmara de Philippe Andrê filma sublimemente as cordas que nos amarram (e se impõem) no nosso devir.

A dureza do amor, o peso que suportamos do outro, sem termos as mais das vezes, espaço para escolha.

É confortável atar-nos uns aos outros na esperança que nos carreguem, que nos façam avançar. Na esperança de sermos intocáveis perante a solidão.

Todavia, as nossas escolham ganham vida própria e acorrentam-nos com violência, impedindo-nos de respirar, de escolher o nosso caminho, de existirmos totalmente.

A esperança reside em descobrir, no turbilhão que turva a individualidade, que podemos existir juntos, de mão dada, lutando contra todos os perigos que invariavelmente se abatem sobre nós.

Escolhendo livremente cordas passíveis de se desatarem sempre que queimem a pele para lá do que é a dureza do caminho.

segunda-feira, outubro 18, 2010

The Golden Age



Há dias em que só faz sentido conduzir sem parar, sentir o sol reflectido através do vidro e o vento na cara.

Somos livres.

domingo, outubro 17, 2010

Os Segredos nos seus Olhos

"He ran to the end of the train and watched as her figure, once gigantic, now shrank in his eyes, but grew more than ever in his heart. "

Benjamin Esposito, in "The Secret in Their Eyes"





Somos educados para a rigidez de sentimentos. Bombardeados por catálogos que nos dizem o que podemos sentir na estação da vida que atravessamos, como que avisando para os seguros constrangimentos de andar descoordenado com as tendências dominantes.

Neste jogo pré-preenchido tendemos a esquecer os segredos que se escondem no nosso olhar, no olhar daqueles com quem nos cruzamos, obliterando qualquer hipótese de nos ligarmos. Caminhamos demasiadas vezes com o olhar parado, sem correr riscos, ignorando sensações viscerais em troca de uma falsa sensação de domínio e conforto.

O que fica no meio de tudo isto? A condenação a viver no passado e a repisar interna e subrepticiamente as oportunidades perdidas em troca de um vazio, tão confortável nas suas grilhetas feitas em série, a combinar com as vidas de catálogo de tantas cópias de pessoas que por aqui circulam. O paradigma do sentimento de pertença como veículo de infelicidade normalizada e docemente dormente.

Não. Eu não quero ter de chocar com alguém para ter a certeza que estou vivo. Não. Eu rejeito este catálogo, já lá vivi, aprisionado e viciado no controlo que me permitia ter, inebriado pelo reconhecimento exógeno de algo que devia permanecer intrinsecamente selado e bacteriologicamente puro.

Ao invés, quero atingir aquele nível de fragilidade em que estou permeável à beleza inesperada e despida da vida, à absorção de tudo o que signifique algo, por muito singelo que seja. Aquele ponto em que sou capaz de estabelecer uma verdadeira troca com alguém de carne e osso, com contradições, receios e vida a correr-lhe nas veias. Aquele cenário onde as defesas estão em baixo e não temos vergonha de tocar os outros.

Deixar algo de nós em outrem, construir algo, marcar e ser marcado. Ser e não simplesmente existir.

Esta é a meta que cada vez mais optamos por descurar.

Não mais. Hoje não.

terça-feira, outubro 12, 2010

Cassius Clay


"I feel like a porcupine sleeping in a waterbed. It's fantastic to feel beautiful again."

In "Cassius Clay", The Wave Pictures

domingo, outubro 10, 2010

Árvores Dançantes em F menor

Hiroshi Nakamura


Troveja, o chão fervilha por entre a chuva e a pressão do alcatrão. Vejo árvores a esvoaçar à frente dos meus olhos e a velocidade do meu caminho não permite que as identifique ou distinga.

O som da impassível realidade ainda ecoa. O constrangimento perante a inexorabilidade do destino traçado e o olhar impotente trocado ainda queima o presente.

Encerra-se um capítulo, levantam-se fileiras, recontam-se espingardas e percebe-se que a guerra nunca passou sequer da sala de estratégia. Uma das partes nunca teve intenção de a ganhar. Nunca foi firme, nunca ousou.

Lá fora, o céu começou entretanto a ceder. Ironicamente, permitiu que alguns raios de sol fugissem, instalando uma falsa sensação de paz.

Escolhas. Sonhar ou quebrar.

segunda-feira, outubro 04, 2010

A superfície

"To be nobody but yourself in a world which is doing its best, night and day, to make you everybody else means to fight the hardest battle which any human being can fight; and never stop fighting."

E.E. Cummings


O peso dos costumes e trends deixa-me, por vezes, sonegado.

Tenho vontade de ultrapassar a superfície onde habita o conformismo acrítico e voltar a respirar livremente.


Ser cru, genuíno, dizer o que penso, omitir o que penso por mero tacto e não por pressão, gritar, rir, um rir vivo e sentido.

Cada vez mais é difícil fugir a este ciclo que nos oprime e nos força.

Como resposta, este mundo inventou algo tão genial quanto tortuoso: a rebeldia pré-concebida e instantânea. Observo muita rebeldia ordenada e contida, pertencendo a cânones tão ou mais rígidos e catalogadores do que aqueles que querem combater.

Perante este paradoxo não posso deixar de sorrir e continuar a tentar furar a superfície. O ar puro é alcançável.